segunda-feira, 20 de maio de 2013

Quer ser vizinho de depósito de agrotóxico?



Quer ser vizinho de depósito de agrotóxico?


Tramita na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul o PL 20/2012, assinado pelo deputado Gilmar Sossela (PDT), juntamente com mais de 30 deputados. O PL trata da flexibilização do armazenamento de agrotóxicos no Estado. No dia 14 de maio, o deputado Giovani Feltes (PMDB) apresentou seu relatório, favorável à aprovação do referido projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Entretanto, o mesmo ainda não foi votado porque o deputado Edegar Pretto (PT) pediu vista do processo, ou seja, utilizou de recurso regimental que concede uma semana para analisar novamente o PL. Cada bancada pode pedir vista uma vez. Os representantes da bancada do PT na CCJ, deputados Edegar Pretto e Raul Pont, têm posição contrária ao PL 20, pelo mérito e por ser inconstitucional, contrariando, por exemplo, os critérios de licenciamento ambiental utilizados pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental Luis Henrique Roessler (Fepam) baseados na legislação ambiental brasileira.

Embora não seja integrante da CCJ e não tenha direito a voto, a deputada Marisa Formolo (PT), participou de reunião referente ao tema e defendeu junto aos deputados da Comissão o voto contrário ao PL 20, expressando uma posição avessa ao uso de agrotóxicos e favorável à agroecologia. A deputada saudou as entidades da sociedade que estavam presentes e lembrou o agrônomo ambientalista José Lutzenberger, que sempre se opôs ao uso de aplicação de agrotóxicos na agricultura.

Estiveram presentes na reunião da CCJ, manifestando-se contra o PL 20, a Fundação Gaia, CEA, Agapan, Rede Ecovida, Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (Capa), Centro Ecológico de Ipê, Núcleo de Ecojornalistas, Apedema, Feira Ecológica, cooperativas de produção agroecológica e de economia solidária, Emater, Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida - RS, entre outras entidades de agricultores e ativistas do movimento ambientalista.

O autor do PL 20 que trata do armazenamento de agrotóxicos, deputado Gilmar Sossela (PDT), defendeu o conteúdo do projeto, construído com a participação das revendas de agrotóxicos, que têm interesse direto na tramitação e criticam as regras estabelecidas pela Fepam.

O autor do PL e o relator na CCJ ignoram a posição da equipe técnica da Fepam, que tem trabalhado com esse tema há anos. Em parecer sobre o PL 20, a biológa Marta Elisabeth Valim Labres, Chefe do Serviço de Licenciamento e Controle de Agrotóxicos, faz uma análise sobre os diversos pontos do PL 20 e definiu como retrocessos à proteção ambiental e à saúde pública em avanços já conquistada e estabelecida nas normas. Atualmente, existem regras elaboradas pelo órgão ambiental, que tem prerrogativa legal de estabelecer as normativas técnicas.

Entre outros pontos divergentes, está a distância do depósito de residências. A Fepam estabelece o mínimo de 30 metros, mas o PL 20 os retira. Sobre isso, diz a Fepam:

O projeto de Lei, no art. 7º, parágrafo único, pretende substituir a exigência da FEPAM de distanciamento mínimo entre depósitos de agrotóxicos e residências pela colocação de filtro, em caso de constatação de odor de veneno. Esta proposta demonstra o desconhecimento de que a ausência de cheiro não significa a ausência de substâncias tóxicas voláteis e de que um filtro não oferece a segurança necessária para a saúde das pessoas do entorno.”

A experiência passada demonstrou que a distância mínima de 30 metros exigida pela Fepam entre depósitos de agrotóxicos e residências não pode ser substituída por equipamentos, pois aqueles capazes de monitorar os gases no lado externo ao depósito são economicamente inviáveis para as empresas e um filtro não seria suficiente, pois estaria saturado em poucas horas”


A Fepam divulga que desde 2003, está orientando para a adaptação às regras de distância mínima. Portanto, há 10 anos muitas revendas estão tentando fugir do cumprimento da legislação. Da mesma forma, a Fepam informa que a maioria das revendas já se enquadrou nas normas, obtendo o licenciamento, mas uma parte insiste em não cumprir a Lei, querendo mudar as determinações.

Nesse debate, importante compreender que é a segurança no armazenamento de agrotóxicos, produtos químicos perigosos, que precisa de regras rigorosas, que protejam a população de danos à saúde e proporcionem às autoridades a possibilidade de agir no caso de acidente. É preciso estar devidamente preparado para uma ação de emergência, como ter acesso ao local de um carro de Bombeiros ou de ambulâncias.

Convém lembrar que, em dezembro de 2012, parte da cidade de Buenos Aires foi encoberta por uma nuvem de fumaça tóxica de odor forte, causando tumulto e preocupação da população, que ficou assustada. O serviço de saúde atendeu várias pessoas e as autoridades evacuaram a área, recomendando às pessoas evitarem exposição à fumaça. A nuvem tóxica foi resultado de um incêndio em contêiner com agrotóxico, fato que aconteceu no porto da capital argentina e que autoridades locais informaram tratar-se de agrotóxico do grupo dos fosforados, denominado Thiodicarb.

Da mesma forma, neste ano, o Rio Grande do Sul foi abalado pelo incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria. Por conta da tragédia, abriu-se um intenso debate sobre a existência de leis e normas técnicas de prevenção de acidentes e sobre a fiscalização de responsabilidade dos órgãos de Estado. Essa tragédia nos alerta sobre a importância da prevenção.

Quando o assunto é estabelecer prioridade à saúde pública e interesse coletivo maior, muitas vezes serão contrariados interesses privados, setoriais e corporativos.

Portanto, é um grande e grave equívoco flexibilizar normas ambientais que protegem a população. A sociedade gaúcha tem motivos e exemplos suficientes, para manifestar posição contrária ao PL 20 ou qualquer outra proposta que coloque o lucro como mais importante que a segurança, proteção ambiental e saúde pública.


Demilson Fortes
Porto Alegre, 20 de maio de 2013.





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