Quer
ser vizinho de depósito de agrotóxico?
Tramita
na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul o PL 20/2012, assinado
pelo deputado Gilmar Sossela (PDT), juntamente com mais de 30
deputados. O PL trata da flexibilização do armazenamento de
agrotóxicos no Estado. No dia 14 de maio, o deputado Giovani Feltes
(PMDB) apresentou seu relatório, favorável à aprovação do
referido projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Entretanto,
o mesmo ainda não foi votado porque o deputado Edegar Pretto (PT)
pediu vista do processo, ou seja, utilizou de recurso regimental que concede uma
semana para analisar novamente o PL. Cada bancada pode pedir vista
uma vez. Os representantes da bancada do PT na CCJ, deputados Edegar
Pretto e Raul Pont, têm posição contrária ao PL 20, pelo mérito
e por ser inconstitucional, contrariando, por exemplo, os critérios
de licenciamento ambiental utilizados pela Fundação Estadual de
Proteção Ambiental Luis Henrique Roessler (Fepam) baseados na legislação ambiental brasileira.
Embora
não seja integrante da CCJ e não tenha direito a voto, a deputada
Marisa Formolo (PT), participou de reunião referente ao tema e
defendeu junto aos deputados da Comissão o voto contrário ao PL 20,
expressando uma posição avessa ao uso de agrotóxicos e favorável
à agroecologia. A deputada saudou as entidades da sociedade que
estavam presentes e lembrou o agrônomo ambientalista José
Lutzenberger, que sempre se opôs ao uso de aplicação de
agrotóxicos na agricultura.
Estiveram
presentes na reunião da CCJ, manifestando-se contra o PL 20, a
Fundação Gaia, CEA, Agapan, Rede Ecovida, Centro de Apoio ao
Pequeno Agricultor (Capa), Centro Ecológico de Ipê, Núcleo de
Ecojornalistas, Apedema, Feira Ecológica, cooperativas de produção
agroecológica e de economia solidária, Emater, Campanha Permanente
Contra os Agrotóxicos e Pela Vida - RS, entre outras entidades de
agricultores e ativistas do movimento ambientalista.
O autor
do PL 20 que trata do armazenamento de agrotóxicos, deputado Gilmar
Sossela (PDT), defendeu o conteúdo do projeto, construído com a
participação das revendas de agrotóxicos, que têm interesse
direto na tramitação e criticam as regras estabelecidas pela
Fepam.
O autor
do PL e o relator na CCJ ignoram a posição da equipe técnica da
Fepam, que tem trabalhado com esse tema há anos. Em parecer sobre o
PL 20, a biológa Marta Elisabeth Valim Labres, Chefe do Serviço de
Licenciamento e Controle de Agrotóxicos, faz uma análise sobre os
diversos pontos do PL 20 e definiu como retrocessos à proteção
ambiental e à saúde pública em avanços já conquistada e
estabelecida nas normas. Atualmente, existem regras elaboradas pelo
órgão ambiental, que tem prerrogativa legal de estabelecer as
normativas técnicas.
Entre
outros pontos divergentes, está a distância do depósito de residências. A
Fepam estabelece o mínimo de 30 metros, mas o PL 20 os retira. Sobre
isso, diz a Fepam:
“O projeto de Lei, no art. 7º, parágrafo único, pretende
substituir a exigência da FEPAM de distanciamento mínimo entre
depósitos de agrotóxicos e residências pela colocação de filtro,
em caso de constatação de odor de veneno. Esta
proposta demonstra o desconhecimento de que a ausência de cheiro não
significa a ausência de substâncias tóxicas voláteis e de que um
filtro não oferece a segurança necessária para a saúde das
pessoas do entorno.”
“A experiência passada demonstrou que a distância mínima de
30 metros exigida pela Fepam entre depósitos de agrotóxicos e
residências não pode ser substituída por equipamentos, pois
aqueles capazes de monitorar os gases no lado externo ao depósito
são economicamente inviáveis para as empresas e um filtro não
seria suficiente, pois estaria saturado em poucas horas”
A Fepam
divulga que desde 2003, está orientando para a adaptação às
regras de distância mínima. Portanto, há 10 anos muitas revendas
estão tentando fugir do cumprimento da legislação. Da mesma forma,
a Fepam informa que a maioria das revendas já se enquadrou nas
normas, obtendo o licenciamento, mas uma parte insiste em não
cumprir a Lei, querendo mudar as determinações.
Nesse
debate, importante compreender que é a segurança no armazenamento
de agrotóxicos, produtos químicos perigosos, que precisa de regras
rigorosas, que protejam a população de danos à saúde e
proporcionem às autoridades a possibilidade de agir no caso de
acidente. É preciso estar devidamente preparado para uma ação de
emergência, como ter acesso ao local de um carro de Bombeiros ou de
ambulâncias.
Convém
lembrar que, em dezembro de 2012, parte da cidade de Buenos Aires foi
encoberta por uma nuvem de fumaça tóxica de odor forte, causando
tumulto e preocupação da população, que ficou assustada. O
serviço de saúde atendeu várias pessoas e as autoridades evacuaram
a área, recomendando às pessoas evitarem exposição à fumaça. A
nuvem tóxica foi resultado de um incêndio em contêiner com
agrotóxico, fato que aconteceu no porto da capital argentina e que
autoridades locais informaram tratar-se de agrotóxico do grupo dos
fosforados, denominado Thiodicarb.
Da mesma
forma, neste ano, o Rio Grande do Sul foi abalado pelo incêndio na
Boate Kiss, em Santa Maria. Por conta da tragédia, abriu-se um
intenso debate sobre a existência de leis e normas técnicas de
prevenção de acidentes e sobre a fiscalização de responsabilidade
dos órgãos de Estado. Essa tragédia nos alerta sobre a importância
da prevenção.
Quando o
assunto é estabelecer prioridade à saúde pública e interesse
coletivo maior, muitas vezes serão contrariados interesses privados,
setoriais e corporativos.
Portanto,
é um grande e grave equívoco flexibilizar normas ambientais que
protegem a população. A sociedade gaúcha tem motivos e exemplos
suficientes, para manifestar posição contrária ao PL 20 ou
qualquer outra proposta que coloque o lucro como mais importante que
a segurança, proteção ambiental e saúde pública.
Demilson
Fortes
Porto
Alegre, 20 de maio de 2013.
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